A tecnologia da informação nos processos urbanísticos
Por Daniela Albuquerque
Arquiteta e Especialista Pleno de Licenciamento do Investe Recife
A cidade é um organismo vivo, dinâmico e em constante transformação, onde as crescentes demandas exigem o desenvolvimento de processos e a criação de estratégias que busquem a melhoria das condições de habitabilidade do espaço urbano e adequações às mudanças sociais e tecnológicas.
O rápido avanço das tecnologias, em especial das digitais, tem transformado a anatomia das cidades e o espaço urbano da cidade do Recife vem se modificando ao longo dos últimos 10 anos.
Por suas boas práticas em planejamento e governança sustentável, o Recife recebeu em 2022 o selo Connected Smart Cities, pelo programa Carbon Disclosure Program (CDP), em reconhecimento pelas ações concretas e estratégias adotadas em direção à construção de uma cidade mais sustentável e resiliente.
Os reflexos podem ser visualizados no dia a dia, pois, atualmente, o Recife ocupa um dos lugares no Brasil mais habilitados a usar a tecnologia para enfrentar os desafios do seu crescimento urbano, buscando soluções inovadoras para seus problemas de mobilidade, infraestrutura e mitigações referente aos impactos decorrentes das mudanças climáticas.
A cidade se propõe a adotar um desenvolvimento criativo, inovador, sustentável e inteligente e, para isso, passou por uma reformulação de seu Plano Diretor (2008). Através da Lei Complementar nº 02 de 2020, teve seus parâmetros e diretrizes revisados ampliando sua perspectiva de crescimento sustentável e de infraestrutura de baixo carbono.
No âmbito nacional, os Planos Diretores são instrumentos garantidos pelo Estatuto da Cidade, onde são estabelecidas “normas de ordem pública e interesse social que regulam o uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança e do bem-estar dos cidadãos, bem como do equilíbrio ambiental” (Lei nº 10.257, 2001).
O Recife tem como base cinco temas que abrangem os desafios de uma metrópole cuja história teve início em 1537: cidade humana, cidade sustentável, cidade inovadora, cidade preservada e cidade integrada.
O constante crescimento das demandas e a busca pela melhoria dos processos de gestão integrada têm levado as cidades brasileiras a investir recursos e capital humano no intuito de melhorar seus processos urbanísticos e oferecer melhores serviços para a sociedade, a partir da adoção de tecnologias na gestão urbana.
No âmbito nacional, o Brasil vem criando ações estratégicas por parte do governo federal para incentivar a utilização de Modelagem Paramétrica ou Building Information Modeling (BIM) para auxiliar na construção de projetos e processos de gestão integrada dos sistemas.
O Decreto nº 9.983, de 22 de agosto de 2019, que dispõe sobre a Estratégia Nacional de Disseminação do BIM e Institui Comitê Gestor da Estratégia do Building, é uma iniciativa criada em 2017 para promover um ambiente adequado ao investimento em BIM e a sua difusão no país.
Em seu Parágrafo Único, a plataforma BIM permite a criação, a utilização e a atualização de modelos digitais de uma construção, de modo colaborativo, de forma a servir a todos os participantes do empreendimento, potencialmente durante todo o ciclo de vida da construção.
Como ferramenta de gestão, a plataforma também pode ser utilizada na escala urbana. Como ferramenta de fomento para cidades inteligentes e sustentáveis, a tecnologia BIM utiliza bases de dados digitais integradas com o objetivo de ajudar em desafios como o crescimento excessivo da população urbana; a inadequação da infraestrutura e dos serviços; a fraca proteção da saúde e segurança dos cidadãos; instabilidade econômica e questões energéticas e ambientais.
Diante da eficiência no acesso e troca de informações contínuas e da eficiência das partes do sistema integrado, a complexidade que é a gestão do ambiente urbano é minimizada. A interlocução entre os diferentes sistemas, auxiliando a tomada de decisão dos profissionais envolvidos, é o ponto-chave para o setor público, pela possibilidade de integração com os sistemas de inteligência artificial (através de plataforma BIM IoT) ou de gestão do território (através de software BIM GIS).
Dentre os temas que encontram benefícios na resolução de problemas com o uso do BIM, podemos citar: crescimento urbano; mobilidade urbana (congestionamento de tráfego); acessibilidade da habitação; mudanças climáticas; desgaste da infra-estrutura; interlocução entre os diferentes sistemas.
Fig 01. Vantagem do BIM nas cidades inteligentes
Fonte: Adaptado de Biblus.acasosofware.com
O uso da ferramenta BIM vem evoluindo e, com isso, transcendendo os limites para alcançar uma escala maior a nível de gestão urbana, ajudando cidades e comunidades inteiras a enfrentar os novos desafios da urbanização. Seu conceito está intimamente associado às cidades inteligentes e sua plataforma colaborativa tem um potencial de desenvolvimento das realidades da vida urbana em seus aspectos de segurança e sustentabilidade de forma integrada e integrativa.
Além disso, o BIM surge como potencializador do licenciamento automático, diante de sua capacidade de criar associações e confrontar distintas informações oriundas de diferentes áreas de acordo com suas peculiaridades e especificidades.
No entanto, ainda há um longo caminho de adaptações e adequações a serem acolhidas para a modelização e parametrização dos dados de um sistema que antes funcionava em um ambiente de caráter físico, onde a cultura (comportamentos e práticas) era compartilhada por determinados grupos, em detrimento a uma cultura digital moldada pela tecnologia digital e pela internet. Seu caráter pioneiro requer certo preparo, tanto no sentido das necessidades de formação e qualificação profissional, como pelos custos de implementação.
Não obstante, cidades brasileiras vêm avançando na busca por um ambiente digital automatizado, no intuito de implementar sistemas que possam contribuir para um licenciamento mais ágil, preciso e objetivo. Recife, Fortaleza, Curitiba, Porto Alegre, São Paulo, Salvador e Belo Horizonte são exemplos que têm buscado melhorias a partir da desburocratização do ambiente de negócios.
Um dos pontos-chaves da administração pública e do desenvolvimento econômico e tecnológico é o foco na inovação, onde as cidades buscam, também, a transparência das atividades governamentais, a melhoria na capacitação dos cidadãos e seu envolvimento na gestão pública.
O Recife é uma das cidades brasileiras que têm buscado melhorias a partir da desburocratização do seu ambiente de negócios, sendo destaque regional e nacional em vários indicadores de sustentabilidade e inovação.
No caminho da eficiência e da desburocratização dos processos de licenciamento, a criação de um Portal Unificado foi o primeiro passo, facilitando o acesso aos principais serviços públicos do Recife, garantindo maior agilidade e ampla visualização de forma integrada.
No cenário nacional, o Recife se destaca como referência de parque tecnológico e de inovação onde a utilização de tecnologias para aprimorar os serviços e facilitar a vida do cidadão é uma prioridade da gestão juntamente com a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, Ciência, Tecnologia e Inovação (SDECTI).
Neste sentido, o Investe Recife, através da sua Assessoria Estratégica, vem desenvolvendo um trabalho em conjunto e articulado com as demais Instituições e secretarias envolvidas, no sentido de ampliar e facilitar o acesso dos investidores criando um ambiente regulatório desburocratizado e com maior transparência, melhorando o acesso à informação.
Sob esse novo olhar integrativo e sistêmico, compreendendo a tecnologia como potencial de interface para uma gestão democrática, trabalhamos para tornar o Recife como destaque e modelo de cidade inteligente empreendedora.
Fig. 02: Recife Cidade Inteligente.
Fonte: @gadelharia
Referencial Teórico:
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